Prometida por todos os governos, a reforma tributária tornou-se uma utopia brasileira.
Sob Lula, a última tentativa foi realizada em 2008. Relatou o projeto o grão-petê Antonio Palocci (SP).
Depois de consumir meses de debate parlamentar e de produzir quilômetros de manchetes de jornal, a coisa foi ao arquivo.
A nove meses e oito dias do término do seu segundo mandato, Lula parece conformado.
Mais que isso: considera a carga de tributos que pesa no bolso do brasileiro –34% do PIB em 2009— necessária.
Lula clareou o seu ponto de vista na coluna semanal “O presidente reponde”, veiculada nesta terça (23) em jornais de todo país.
Numa das questões dirigidas a Lula, o atendente de farmácia Luciano da Silva, morador da cidade de Jaguaré (ES), anotou:
“Os brasileiros estão entre os que mais pagam impostos no mundo. Nem por isso nossos serviços públicos são melhores”.
Feita a observação, inquiriu: “Existem medidas destinadas a reduzir os impostos ou a melhorar os serviços públicos?”
Em sua resposta, Lula reconheceu: “Nossa carga tributária [...] não é das mais baixas”. Mas ponderou que “está longe das mais altas do mundo”.
E passou a esgrimir um discurso que, em essência, justifica o avanço sobre o bolso do contribuinte com a necessidade de prover verbas para o social.
“Há países”, escreveu Lula ou algum assessor em seu nome, “que prestam serviços públicos de excelência, mas cuja carga é muito mais elevada”.
Citou “Suécia (48%) e Dinamarca (49%)”. Prosseguiu: “Outros países, têm carga tributária baixa, mas o Estado é praticamente ausente”.
“No Brasil é diferente”, Lula acrescentou. “Com os impostos, nós investimos de forma inédita em programas sociais”.
Programas “como o Bolsa Família, que beneficia 12,4 milhões de famílias”. Ligou os benefícios à crise financeira global:
“Com os programas [sociais] e o aumento real de 76% do salário mínimo desde 2003, nós fortalecemos tanto o mercado interno, que atravessamos a crise sem maiores danos”.
Celebrou: “Enquanto o mundo perdeu 16 milhões de empregos em 2009, nós criamos 995 mil”.
E quanto à qualidade do atendimento prestado à bugrada nas repartições públicas? “Estamos investindo na melhoria dos serviços públicos”, Lula anotou.
Convidou Luciano, o atendente de farmácia que lhe dirigiu a pergunta, a observar o que se passa nos guichês do INSS.
“Com o agendamento por telefone acabamos com as filas e hoje as aposentadorias são concedidas em meia hora”. Debitou o passivo na conta dos antecessores:
“Há muita coisa a fazer porque o abandono vem de décadas, mas estamos avançando na solução dos problemas”.
É um tipo de discurso que, escorado no gerúndio, pode ser usado por qualquer um, a qualquer tempo.
Em 2014, o sucessor de Lula poderá dizer, de fronte alta: “Estamos investindo”. Em 2018, o sucessor do sucessor poderá festejar: “Estamos avançando”.
E a mordida imposta ao "contribuinte" sempre parecerá incompatível com a qualidade dos serviços que lhe são –ou deveriam ser— prestados.
terça-feira, 23 de março de 2010
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